Eveline


Bom dia. Que bom acordar cedo e aproveitar o dia. E finalmente sentei em meu lugar preferido de SP, o parque Trianon Masp. Aqui é tipo um jardim secreto em plena Avenida Paulista. Gosto tanto que nem sei... É um lugar que tudo para em mim, menos o que está do lado de dentro,  e essa parte que não para, acalma, muda de tom, sinto,[re]ciclo. 
Olho pra o outro lado e construo/sinto coisas.
O lugar é tão verde, cheio de caminhos, cheio de passarinhos e tem um cheiro tão bom! Faz frio e também por isso fico feliz. Aqui, me concentro com tanta leveza que nem escuto mais os carros ou helicópteros na Paulista. 
Pego um café, o preferido daqui que é logo ali na esquina, e trago pra cá. Respiro, leio um pedaço de Lavoura Arcaica, "Pondo folhas vermelhas em desassossego, centenas de feiticeiros desceram em caravana, dos altos dos galhos, viajando com o vento...".
 Penso em tanto. Por aqui, as pessoas correm, passeiam com os cachorros, uns passeiam com seus companheiros, outros abrem o jornal, outros apenas respiram. Ando mais. Tiro fotos, leio mais. Algumas pessoas, assim como eu, apenas sentam nos bonitos banquinhos de madeiras que dão charme ao lugar. Tem um banco desses com uma fita vermelha amarrada no pé. Fico tentando imaginar em que contexto ela foi parar lá. Talvez exista uma história bonita amarrada ali.Respiro (suspiro? ). Escuto uma música. 
O dia está bonito, céu bem azul, nuvens brancas espaçadas, o sol parece querer gritar, mas o frio de 16 grau não o deixa. O café está esfriando. Como disse, o céu está bonito, mas segundo a previsão do tempo, talvez, chova ainda hoje. Ou daqui uns dias, em outros lugares que eu estiver. E sim, por isso, talvez  eu precise de algo amarelo pra me proteger. 





 Eveline.  12:05 h



Eveline
Silence is all we dread.
There's Ransom in a Voice –
But Silence is Infinity.
Himself have not a face.


[ Emily Dickinson]

O Silêncio é o que tememos.
Há um Resgate na Voz –
Mas Silêncio é Infinidade.
Não tem sequer uma Face.

[ Emily Dickinson, tradução de Jorge de Sena]
Eveline


É domingo, mas acordei cedo com a pretensão de colocar em dia todas as pendências.  A gente sempre acha que tem um dia que pode arrumar tudo, por dentro e por fora, mas a verdade é que, às vezes, as entrelinhas das horas não deixam. Hoje, o que não me deixou começar a ordenar tudo [Não, não sou virginiana]  é essa chuva bonita caindo pela minha janela. Não dá pra se isentar desse barulho que acalenta tudo por dentro.  O cair da chuva parece um estado que faz com que o tempo pare e que nesse tempo a gente pode sentir e fazer tudo o que quiser, como se existisse uma licença natural pra isso.  Vou pra janela e simplesmente fico lá, longos minutos a fio. O café esfria e nem dou conta. Penso em tanta coisa que o que não cabe mais em mim mando a chuva levar com ela. Nunca soube fazer preces bonitas, mas acho que fiz uma hoje, mesmo que em silêncio, mesmo sem saber se a chuva ouviu.  A chuva  lê a gente,  [ou seria o contrário?] desvira cada palavra truncada do lado de dentro, mesmo que elas se desvirem da maneira mais silenciosa e que continuem ali, de alguma forma, escritas em outra cor, no canto delas.   É então que o barulho da chuva vai dialogando com as músicas do B.B. King.  A chuva é blues,  mas  também é blue. Daquele tipo de azul que é leve, tímido ou que parece querer gritar em neon.  Com o blues e com as palavras [des] truncadas, a chuva transparente  agarra o azul. E, o que importa, no final das contas, não são as pendências do lado de fora e nem  do lado de dentro, mas que neste domingo, aparentemente qualquer de junho, a chuva, B.B. King, uma prece e  café frio  pintaram tudo de Blue [s].  
So, let it rain, let it rain...  =) 
Eveline.